Acordei já passavam das 11:00 da manhã. Ainda com os olhos fechados, coloquei a mão no lado direito da cama, o seu lado. Estava gelada. Não havia nenhum vestígio seu. O paletó que estava pendurado em meu closed, o celular que estava na penteadeira, as chaves na mesinha da sala, o restante do vinho que deixamos na cozinha e as taças sujas: tudo havia desaparecido. No banheiro, apenas a minha toalha de banho, sem nenhum pertence seu, como costumava existir. Nenhum bilhete, nenhuma mensagem na secretária eletrônica, nenhum e-mail novo na caixa de entrada. Desespero senti ao pegar meu celular. Nenhuma mensagem, nem as antigas. Fui até seu número, resolvi telefonar. Havia sumido. Estava tudo muito estranho. Tínhamos um relacionamento estável. Tínhamos não? Comecei a pensar nas últimas coisas que aconteceram. Mas lembro com muita nitidez, eu não estava bêbada. Nós fomos jantar naquele restaurante Japonês que ele adorava. Tomamos um vinho, e depois assistimos um filme, daquelas comédias românticas cujo final sempre é previsível. Bom, tentamos assistir.. ele não parava de mexer nos meus cabelos cacheados...me chamando de cachinhos dourados.. Aquilo era um sinal de estabilidade, não era? Ele foi tão carinhoso... acabei adormecendo no seu colo. Lembro bem do momento que me chamou para ir para a cama, ele dizia que o sofá ainda ia acabar com minha coluna. Me carregou no colo até o quarto. Pedi que dormisse comigo, e, com um sorriso doce e um suspiro me respondeu: Tenho escolha? Ele quis ficar. Não o forcei, foi um convite. Por que desapareceu assim, misteriosamente? Não foi um sonho, não pode ter sido. São muitas lembranças pra se tratar apenas de um sonho. As fotos! É isso. Revirei as fotos no computador. Já fazia meses (4, 5? nunca fui muito de decorar datas...) que estávamos assim, desse jeito. Nenhuma onde ele e seu cabelo a la Elvis aparecesse. Como assim? Lembrei da minha caixinha de música, única lembrança de minha mãe, que eu guardava com todo zelo escondido no closed. Ninguém sabia da existência dessa caixinha. Junto com ela, ficava meu diário - sim, apesar dos 25 anos, ainda tenho um diário- e alguns polaroides. Aquele dia, no parque de diversões, fizemos muitíssimas fotos. Estavam todas ali. Tinham que estar. E realmente estavam. Estas ele não conseguira levar. O que aconteceu pra que ele partisse dessa maneira? Não lembro de nenhum detalhe que pudesse o desagradar. Muito pelo contrário... Eu estava agindo da melhor maneira, sem pressão, ciúmes, estresse. Foi quando uma lágrima rolou. Há quantos anos eu não chorava? Desde que minha mãe partiu, há 2 anos, não permiti que nenhuma lágrima saísse de meus olhos. Me tornei, externamente, forte, fria, calculista. Ninguém tinha entrado em minha vida depois de tudo. Até aquele dia que nos esbarramos na livraria. Eu só queria entender o motivo da sua partida misteriosa. Passaram-se dias, semanas... A cada dia sem ele,as lembranças eram mais fortes, e eu morria lentamente. E numa desses flash's de memória, recordei a cena de nosso último jantar, e suas palavras: -"Você é muito especial. Pra mim. Nunca se esqueça disso." Agora percebo o quanto tudo aquilo parecia uma despedida. O restaurante preferido dele, o melhor vinho (era nítido que aquele vinho custara muito caro) e todo o carinho que teve comigo. Ele tivera o cuidado de sumir e não deixar vestígios. Que ele soubesse. Mas porque? Será que imaginou que, eu seria capaz de esquecê-lo? E porquê isso? Procurei-o em todos os lugares. Naquela cidade grande era difícil encontrar qualquer pessoa que quisesse ser encontrado, quem dirá se estivesse se escondendo. O jeito era me conformar. Retornar para minha cápsula de mármore, onde ninguém tinha permissão de entrar. Mais ninguém.
[Escrito por Melanie C.]
Postado por Thuany Santos